22/04/2010

III Fórum dos Povos Indígenas do Acre

por Agência de Notícias do Acre, 22/04/2010

Comunidades indígenas de todo estado se reúnem em Mâncio Lima para discutir políticas públicas. No 3º Encontro produção agroextrativista, valorização cultural e qualidade de vida nas aldeias foram os principais assuntos debatidos.

20/04/2010

Encontro realizado na Terra Indígena Puyanawa reúne representantes de 33 Terras Indígenas

Assessor dos Povos Indígenas ressaltou importância da organização dos povos e comunidades para receberem os investimentos públicos (Foto: Onofre Brito/Secom)

3º Fórum dos Povos Indígenas do Acre

por Flaviano Schneider, Agência de Notícias do Acre, 20/04/2010

O 3º Fórum dos Povos Indígenas do Acre, na Terra Indígena Puyanawa, município Mâncio Lima começou nesta segunda-feira, 19 de abril, dia que se comemora o Dia do Índio no Brasil. E durante os próximos quatro dias, cerca de 100 indígenas, representando 33 Terras Indígenas, pertencentes às 15 etnias existentes no Estado, vão relatar experiências e a situação vivida por suas aldeias. Nos dois primeiros dias, além da apresentação do histórico e situação atual do movimento indígena, vai acontecer o ‘diálogo das aldeias' em que as diversas aldeias se apresentarão e também as organizações indígenas como Opirj, Opitar,Opire, Fephac,Opiac, Sitoakore, etc. No dia 21 de abril serão apresentados os fundamentos da política indigenista do Governo do Estado e o plano de valorização dos povos indígenas.

No último dia, grupos temáticos estudarão e fornecerão subsídios para as políticas públicas do governo. Nesse dia também vai acontecer assinaturas de convênios com associações indígenas para implementação do ProAcre. O secretário dos povos indígenas, Francisco Pinhanta, anunciou a presença do governador Binho Marques no último dia do encontro, quando será feita a premiação de diversos ganhadores do I Prêmio de Culturas Indígenas e o lançamento da revista: ‘Povos Indígenas do Acre'. As noites são dedicadas a apresentação de danças e sessões de pajelança, com a bebida sagrada Ayahuasca.

Para o diretor-presidente do Instituto Dom Moacir, Irailton Lima, o grande debate é o aprofundamento da compreensão do que são os planos de gestão dos territórios: "Esperamos que daqui saiam novas demandas para o poder público".

Demandas indígenas

Na abertura do encontro o povo Ashaninka, que habita no Alto Envira, apresentou demandas decorrentes de seu isolamento. O secretário Francisco explicou que em alguns lugares é difícil o governo chegar e que é necessária a organização das comunidades: "A gente está fazendo um grande esforço nos últimos anos para que as comunidades comecem a assumir parte desses serviços para que os benefícios cheguem às comunidades. Queremos chegar de maneira segura e isto só acontecerá se as comunidades estiverem organizadas. As cobranças aparecem, mas a gente vê isso como um processo de construção. Já houve avanços".

O presidente da Organização dos Povos Indígenas do Vale do Juruá (OPIRJ), Osmildo Kuntanawa, ponderou que como os governos federal, estadual e municipal trabalham dentro da lei e só podem destinar recursos para quem estiver organizado, resta às comunidades indígenas se organizarem. "Para fazer parte do programa do governo as lideranças têm que saber trabalhar em suas terras. Para isso precisamos pessoas que nos levem as informações, que apliquem cursos dentro das terras indígenas para formação de lideranças. A gente (os Kuntanawa) ainda não tem terra demarcada mas estamos recebendo apoio do governo. Estamos cadastrados na saúde e temos professores na escola diferenciada".

Dia do Índio

O 3º Fórum é realizado na Escola Estadual Indígena Ixubai Rabuí Puyanawa e cineliy com diversas apresentações de danças e brincadeiras típicas, lembrando o quanto está viva a tradição indígena Puyanawa. Muita emoção por parte do cacique Mário Puyanawa: "Estou muito emocionado. Os parentes vêm de tão longe para participar desse encontro em nossa aldeia e queremos que todos se sintam bem. Vamos ouvir e saber das dificuldades de cada um e o governo está aí para ouvir também". O cacique Puyanawa se diz muito satisfeito com o movimento indígena hoje. Contou que no início da mobilização os índios não sabiam se expressar. "Hoje vejo índios de todas as etnias falando muito bem, falando o que sente e explicando sua situação para os outros parentes; é uma troca de experiências e todos percebem quem é organizado e este serve de exemplo para os outros".

Na noite deste 19 de abril, aconteceu também uma pajelança com Ayahuasca e rapé. O cacique Yawanawa e pajé, Biraci Brasil, disse que o encontro foi excelente e lembrou os anos 1980. Foram entoados cânticos por cinco diferentes etnias e todos se harmonizaram. Para Biraci, o brilho e a harmonia da pajelança indicaram que os povos indígenas acrianos estão partindo agora para uma nova fase de harmonia e desenvolvimento espiritual.

19/04/2010

Fazendo a diferença


Aldeia indígena cria associação e cooperativa para se proteger e gerar sustentabilidade

por Rafael Carneiro da Cunha, Portal do Aprendiz, 19/04/2010

Com o objetivo de se proteger do trabalho escravo e da violência exercida por posseiros, a população indígena Ashaninka, da aldeia Apiwtxa, que vive próxima ao Rio Amônia, no município de Marechal Thaumaturgo, no Acre, fundou em 1989 a Associação Apiwtxa. Hoje o grupo desenvolve um trabalho de manejo para recuperar os recursos de sua reserva e possui uma cooperativa.

Além de proteger a população da aldeia, a constituição da associação foi uma forma de lutar mais organizadamente pela demarcação de terra, que se iniciou em 1985 e foi concluída em 1992. A aldeia Apiwtxa conta com 483 habitantes e uma área de cerca de 870 mil quilômetros quadrados, que faz divisa com o Peru.

Lá, atividades como o manejo florestal, repovoamento de rios e matas com animais nativos, como os tracajás (um tipo de quelônio), são praticadas. “Nós enfrentamos muita resistência do governo que quer implantar sua própria política. Infelizmente a gente acaba sofrendo algumas interferências, mas tentamos buscar sempre uma autonomia para o que fazemos. Nós também temos nossa forma de fazer ciência”, explica o tesoureiro da associação, Issac Piyãko.

Em 1989 a aldeia criou o primeiro Sistema de Recuperação do território, utilizando práticas de manejo sustentável, trabalho que continuou em 1992 quando foi desenvolvido um projeto de pesquisa que contribuiu para a análise do território com o objetivo de criar alternativas de sustentabilidade econômica e ambiental visando a autonomia do povo. Com um centro de pesquisa consolidado iniciou-se o reflorestamento. Foram 146 árvores frutíferas e de madeiras de leis plantadas, das quais foi possível em um ano tirar mais de 50 toneladas de alimentos para a comunidade.

Para difundir esse conhecimento que vem dos antepassados foi inaugurado em 2007 o Centro de Formação Yorenka Ãtame – Saber da Floresta, localizado em frente à sede do município de Marechal Thaumaturgo. No local, oficinas de educação, cultura, meio ambiente e seminários são oferecidas para comunidades indígenas do município.

Hoje a aldeia ainda enfrenta problemas com as madeireiras peruanas, que invadem o território e ameaçam sua integridade. A comunidade se manifesta fazendo denúncias por meio de um blog, que conta também com diversas informações sobre a população, a associação e a cooperativa.

Outro meio de sustentabilidade da aldeia é a constituição da cooperativa Ayompari, que trabalha com a produção de tecelagem, instrumentos e artesanato. A venda se limita a turistas que passeiam pela região e outras comunidades vizinhas. Além disso, pessoas de outros municípios e de outros estados do país podem fazer encomendas. Os produtos feitos pela cooperativa estão expostos no site: AQUI

Registro

As histórias do povo Ashaninka podem ser conferidas no quinto DVD da coleção “Cineastas Indígenas: Um Outro Olhar”, produzido pela ONG Vídeo nas Aldeias. A coleção também reúne documentários de outras aldeias indígenas do Brasil.

Os filmes referentes aos Ashaninkas são: “Shomõtsi” (2001), “A Gente Luta, mas Come Fruta” (2006), “No Tempo da Chuva” (2000), “Caminho para a Vida”, “Aprendizes do Futuro” e “Floresta Viva” (2004).

15/04/2010

Índio no Cinema


Em Rio Branco, capital do Estado, mais de 70 obras podem ser vistas sobre o cotidiano das comunidades de várias regiões. Os filmes foram feitos pelos próprios índios.

por Globo Rural, Edição Diária, 15/04/2010

Documentários gravados em aldeias indígenas são exibidos nesta semana no Acre. Em Rio Branco, são vistas mais de 70 obras sobre o cotidiano das comunidades de várias regiões feitas pelos próprios índios.

Em um dos documentários, a comunidade xavante do Mato Grosso realiza a iniciação espiritual de jovens índios. No início, havia uma grande resistência dos índios por causa do medo das câmeras filmadoras. “O pessoal acredita que eles roubam a alma. Então, no início teve toda a preparação. É importante registrar”, falou Caimi Xavante, cineasta indígena.

Superado o medo, o resultado é visto em belas imagens que retratam a cultura dos povos. Bebito Pianko produz filmes há mais de dez anos. Ele é da comunidade Ashaninka do Acre. Manusear a câmera virou tarefa fácil. O último filme dele mostra o trabalho da comunidade para recuperar os recursos naturais da floresta amazônica.

“Não é apenas para o financeiro. É mais para que as pessoas entendam quem somos e nossa preocupação com o território”, falou Pianko.

As cenas da vida real das aldeias ganham as telas em exibições públicas que ultrapassaram as fronteiras. Os vídeos exibidos em Rio Branco foram vistos em mais de 20 países, como os Estados Unidos, Canadá, França e até no Japão.

Na platéia, com a maioria de crianças, os filmes despertaram o interesse pela preservação da cultura e também do meio ambiente.

“São filmes que estão sendo reconhecidos como um novo olhar sobre a realidade indígena. A visibilidade nacional é muito importante para os índios”, falou Vicente Carelli, organizador da mostra.

Veja mais aqui!

14/04/2010

Alunos de escolas públicas do Rio assistem documentário produzido por Apiwtxa


Assista aqui um trecho do filme A gente luta mas come fruta!

Currículo escolar da rede estadual inclui aula de cultura indígena

por O Dia Online - Educação, 14/04/2010

Rio - A valorização da cultura indígena e a importância do índio como principal protagonista da história do Brasil são algumas das lições aprendidas pelos alunos dos colégios Paulo Freire, no Cachambi, Zona Norte do Rio, e Joracy Camargo, em Belford Roxo, na Baixada Fluminense. Durante todo o ano letivo, as escolas estaduais cumprem as exigências da Lei n° 11.645, que inclui no currículo acadêmico a história indígena. Nesta terça-feira, na semana do Dia do Índio, que é comemorado dia 19 de abril, alunos das duas unidades escolares se reuniram para desvendarem juntos as verdades e os mitos sobre os nativos brasileiros.

Na aula especial, os estudantes conheceram as tradições dos índios, relatadas pelos “caras pálidas” em canções, filmes e livros. Os diferentes costumes, rituais religiosos, danças, artes e línguas encantaram os jovens. Eles tiveram a oportunidade de entender um pouco mais sobre essa diferente manifestação cultural e o modo de vida dos mais antigos habitantes do Brasil no documentário A gente luta, mas a gente come a fruta. No filme, produzido por índios Ashaninka de Apiwtxa, os alunos acompanharam o cotidiano da tribo que vive na fronteira com o Peru.

"Eu acho muito interessante a inclusão da história indígena na nossa grade curricular e a exibição de documentários que nos aproximam da cultura desse povo. Os estudantes precisam conhecer mais profundamente a história dos índios e do Brasil. Esse debate é muito legal, porque reúne opiniões diferentes e nos ajuda a refletir. Precisamos aprender mais sobre eles. São os nossos antepassados", afirmou a aluna do Colégio Paulo Freire.

13/04/2010

Apiwtxa é contemplada com o Prêmio Culturas Indígenas


FEM entrega vídeos para SEE e anuncia contemplados no Prêmio Culturas Indígenas

por Tatiana Campos, com foto de Angela Peres, Agência de Notícias do Acre, 13/04/2010

Secretária de Educação, Presidente da FEM e Assessor dos Povos Indígenas na entrega de kits

A Fundação Elias Mansour (FEM) entregou à Secretaria Estadual de Educação, na manhã desta terça-feira, 20 Kits Cineastas Indígenas, compostos por 5 DVD's com produções cinematográficas indígenas. Também foram anunciados os contemplados no Prêmio Culturas Indígenas, que receberão R$ 10 mil para executar projetos de atividades culturais.

Para a secretária de Educação, Maria Corrêa, os kits chegam em boa hora. "Estamos num momento de discussão dos referenciais curriculares da secretaria e pretendo que se amplie esse debate em torno das questões culturais que deram origem ao nosso povo", disse.

A intenção da Secretaria de Educação é mudar a visão que os alunos possam ter sobre a cultura indígena. "Muitas vezes os índios são vistos como folclore e um material como esses DVDs vai permitir diversas abordagens interdisciplinares para que os nossos alunos tenham contato com esta cultura, seus costumes e tradições, seu modo de vida", explicou.

Bebito Piãnko, da etnia Ashaninka, é um dos videastas que participam da Mostra Vídeo nas Aldeias e o material produzido por ele e seus parceiros também faz parte do Kit Cineastas Indígenas. "Trabalhar com o audiovisual é uma experiência nova e uma oportunidade interessante. A câmera é um equipamento que não faz parte da nossa cultura, mas nos permite mostrar a nossa cultura para outros povos e este intercâmbio está acontecendo no Brasil", comentou.

Os kits contêm documentários produzidos pelas etnias Ashaninka, Guarani, Huni Kui, Kuikuro e Xavante.

FEM anuncia contemplados no Prêmio Culturas Indígenas

As 20 iniciativas contempladas no editado do Prêmio Culturas Indígenas foi divulgada na manhã desta terça-feira, pelo presidente da Fundação de Cultura Elias Mansour (FEM), Daniel Zen. O anúncio aconteceu na mesma cerimônia que entregou à Secretaria de Estadual de Educação os Kits Cineastas Indígenas. Foram apresentadas 42 propostas de atividades culturais que variaram de produção de vídeos a festivais de cultura.

Segundo Zen, o edital teve um caráter atípico, pois ficou aberto durante um longo período de tempo. "A intenção era percorrer a maior quantidade possível de terras indígenas e aldeias para divulgar o prêmio, que é uma oportunidade de contemplar e promover a cultura indígena no nosso Estado".

O prêmio faz parte do Programa de Valorização dos Povos Indígenas e visa fortalecer as expressões culturais e a identidade dos povos, contribuindo para o fortalecimento de suas tradições e para o reconhecimento da sua importância para a diversidade cultural acreana.

Cada proposta contemplada vai receber R$ 10 mil, que serão repassados para as aldeias e comunidades responsáveis pelas iniciativas, além do certificado de premiação. As iniciativas beneficiadas atendem as áreas de audiovisual, artes visuais, literatura/comunicação, música, patrimônio material e imaterial e abrangem todos os segmentos como os rituais, festas tradicionais, língua, tradição oral, entre outras.

Confira a lista das 20 iniciativas contempladas com o Prêmio Culturas Indígenas do Acre aqui!

12/04/2010

Mostra Vídeo nas Aldeias: com a presença dos cineastas indígenas


Filmes produzidos por índios levam o olhar das tribos para a população: Começa a Mostra Vídeo nas Aldeias

por Samuel Bryan, Agência de Notícias do Acre, 12/04/2010

O cinema é mais do que entretenimento, é um processo de aprendizagem. Sob essa ótica, Rio Branco recebe a partir desta segunda-feira, 12, a Mostra Vídeo nas Aldeias, que vai até o dia 18 de abril, levando filmes produzidos por cineastas indígenas dentro de suas próprias aldeias. A mostra acontece em 5 pontos da cidade em diversos horários, Filmoteca Acreana, Cineclube Som da Floresta, Cineclube Aquiry, Teatro Barracão e Biblioteca da Floresta, sendo esse último ponto exclusivo para exibições agendadas de alunos do sistema público. Todas as sessões possuem debate após as exibições com os cineastas que produziram os vídeos.

Assim, os vídeos demonstram a ótica do próprio índio. A mostra, que é a primeira do gênero, também é uma forma de abordar como as novas gerações indígenas conseguem interagir muito bem entre manter suas tradições culturais e novas maneiras de preservar a cultura de seu povo, através dessa forma importante que é a documentação cinematográfica. São dezenas de filmes premiados e aclamados em diversas partes do mundo, como a Europa e alguns países da Ásia, como o Japão.

A mostra traz produções realizadas nas aldeias dos povos Ashaninka, Guarani, Huni Kui, Kuikuro e Xavante. Vicente Carelli, cineasta curador da mostra, explica que "levar ao conhecimento da população brasileira a cultura indígena é fundamental. É um novo olhar sobre essa cultura". Já para o cineasta acreano Valdete da Silva Pinhanta, o Bebito, da etnia Ashaninka, que também está com produções na mostra, afirma que as produções "ajudam a mudar o conceito de visão dos índios. Quando se fala de índio, as pessoas pensam que tudo é uma cultura só, não é. Cada tribo tem sua cultura e os filmes servem para mostrar parte disso".

Educação

A mostra também será um momento importante para divulgar em Rio Branco a distribuição dos Kits Cineastas Indígenas para as escolas de todo o Brasil, numa cerimônia de lançamento com a Secretaria de Educação do Acre, na Biblioteca da Floresta, no dia 13 de abril, às 9 horas. Os kits são compostos de 5 DVD's contendo produções cinematográficas indígenas. Financiado pela Petrobras , o projeto almeja chegar a 3 mil escolas em todo o território nacional.

Veja a Programação em PDF aqui!

01/04/2010

Almamaque de Cultura e Transformação Ibero-Americana

“Eu fico lá com meus pais, e a gente vem trabalhando o desenvolvimento, o reflorestamento e repovoamento. Depois que conseguimos nosso território, que era muito devastado na época pelas madeireiras, começamos a fechar e trabalhar para que isso não acontecesse de novo.”

Por Thereza Dantas, no Almanaque de Cultura e Tranformação Ibero-Americana

São quase 15 anos de trabalho de repovoamento e reflorestamento a partir da Aldeia Apiwtxa, Terra Indígena Kampa do Rio Amônia, no município de Marechal Thaumaturgo, Vale do Juruá, no Estado do Acre. Quem conta um pouco dessa história é Wewite Ashaninka, também conhecido por Bebito, o cameraman do povo Ashaninka.

A família de Wewite é uma das fundadoras da Apiwtxa, uma ONG que trabalha com questões ligadas à terra e ao reconhecimento do patrimônio cultural desse povo. Um detalhe curioso: o povo Ashaninka, oriundo do Peru, é numericamente mais populoso do outro lado da fronteira (cerca de 60 mil) e no Brasil não chegam a 1 mil. Mas os que estão em terras brasileiras estão se articulando para manter suas terras e as tradições da sua cultura por meio de parcerias com instituições públicas e particulares, brasileiras e estrangeiras. O irmão de Wewite, Isaac Pinhantã Ashaninka, é hoje Secretário do Meio Ambiente do Município de Marechal Thaumaturgo. “A minha família é quem está mais integrada nos assuntos da Apiwtxa. O meu trabalho é mais com a documentação de imagens da região”, explica Wewite. O “trabalho de documentação”, feito com equipamento profissional audiovisual, também faz parte da estratégia do povo Ashaninka para preservar suas tradições.

O cameraman Wewite Ashaninka é um dos realizadores indígenas que participam do trabalho da ONG Vídeo nas Aldeias e que, junto com seu irmão Isaac, realizou o documentário A gente luta mas come fruta, que recebeu em 2007 o prêmio Panamazônia ActionAid, da organização não-governamental internacional ActionAid. No documentário, cenas de como os Ashaninkas estão trabalhando para recuperar os recursos da terra, explorada de modo desordenado pelos brancos. Madeireiros peruanos são sempre a grande preocupação do povo Ashaninka para poder manter a floresta em seu território, já antes ali destruída, tal como continua a acontecer do outro lado da fronteira. O mesmo vale para os traficantes, cuja rota, a partir da Colômbia ou do Peru, atravessa seu território. Eles já ofereceram fortunas para que se estendesse nas aldeias a plantação e o refino da coca – cujas folhas os indígenas mastigam em situações que exigem esforço físico e ainda utilizam em seus rituais xamânicos, sendo, portanto, cultivada nas unidades domésticas da aldeia, mas sempre em quantidade ínfima. Sua recusa em transformar em economia de escala uma prática enraizada em seus costumes, mostra o quanto compreendem a necessidade de manter seu modo de vida para poder preservar as tradições de sua cultura.

Outro líder reconhecido da ONG Apiwtxa, Benki Piyãko, um dos responsáveis pelo Centro de Saberes da Floresta Yorenka Ãtame, viaja o mundo explicando o trabalho de se manter “a floresta viva, em pé”. O Centro Yorenka Ãtame, criado em 2006, foi idealizado por sete irmãos para realizar um sonho de seu avô, Samuel Piyanko, desde os tempos em que se discutiam as primeiras propostas de se manterem reservas extrativistas para assegurar a exploração sustentável dos seringais: era preciso “promover a união de índios e brancos para perpetuar a principal fonte de abastecimento de suas famílias e vizinhos – a floresta viva”. No Centro são oferecidas oficinas de capacitação de índios e não-índios, jovens, homens e mulheres, que recebem bolsas para aprender e trabalhar com os “saberes da floresta”, acumulados pelo povo Ashaninka em séculos de sua história. O Centro foi construído em uma área de pasto próxima à cidade de Marechal Thaumaturgo, que está sendo totalmente reflorestada. Índios Ashaninkas do Peru, em sua maioria jovens, são presença constante nessas oficinas de capacitação, que incluem desde conhecimentos sobre apicultura até o registro da memória das comunidades por meio das TIC’s – Tecnologias da Informação e da Comunicação. Dada a presença dos sofisticados equipamentos de gravação e projeção de vídeos, proporcionados pelo MinC, ao incorporar em 2008 o Ponto de Cultura Interação: Culturas Indígenas e Cultura Digital da ONG Apiwtxa, o Centro vem se tornando cada vez mais um lugar de lazer para a população da cidade.

E aí Wewite é peça fundamental na manutenção das tradições do povo Ashaninka. O apelido cameraman veio em função das belas imagens captadas por sua filmadora. É numa oficina de edição de imagens, oferecida pela ONG Vídeo nas Aldeias, que converso com ele sobre a cultura Ashaninka. É por Wewite que descubro que sua mãe é mulher branca, cabocla filha de seringueiro que nunca mais voltou para o mundo dos homens brancos depois de casar com seu pai, porque este é o costume Ashaninka, mas educou seus filhos para fazer a ponte entre a aldeia e os seringueiros. Descubro, também, que ele é casado com uma indígena de outro povo, mas que seu filho será Ashaninka porque, na tradição de seu povo, as esposas vão para a terra do marido e passam a fazer parte do grupo, incorporando seus costumes e sua cultura. É com ele que vejo as casas de madeira erguidas a um metro de altura do chão e crianças aprendendo a falar a língua de seus antepassados. “Além de realizador, também sou professor, membro da OPIAC: a Organização dos Professores Indígenas do Acre”, ele nos conta.

São estas redes, virtuais e físicas, que aproximam várias iniciativas indígenas na manutenção da floresta e tradições culturais de povos distintos. Além da OPIAC, que tem como objetivo promover, defender, desenvolver e divulgar a educação escolar indígena de forma específica e diferenciada, a Rede dos Povos da Floresta investe na infra-estrutura de comunicação e informação, inclusão digital e intercâmbio entre os diversos povos tradicionais da região amazônica. Criada em 2003, como uma revitalização da Aliança dos Povos da Floresta – mobilização feita por índios e seringueiros liderada por Chico Mendes e Ailton Krenak em fins da década de 80 –, ela retoma a agenda que resultou na criação das reservas extrativistas e na correção das políticas do Banco Mundial para o financiamento de grandes projetos de impacto socioambiental, nas regiões de florestas tropicais em todo o mundo.

O realizador indígena Wewite conta que a Cooperativa Ayonpare, que vende via internet adornos e roupas pelo blog da Apiwtxa, mobiliários e peças de decoração criados pelos Ashaninkas, foi durante anos o único meio de sustento da comunidade. “Pode parecer estranho, mas o que nos sustentou durante alguns anos foi a venda on-line de peças que fabricamos na nossa aldeia”. Não é nenhuma surpresa e nem estranho, quando se sabe que o povo Ashaninka, orgulhoso de sua cultura, tem como forte característica a capacidade de conciliar sabiamente costumes e valores tradicionais com idéias e práticas do mundo dos brancos, na defesa de suas tradições.

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