De um lado, os indígenas do Povo
Ashaninka da comunidade Apiwtxa do Amônia. Do mesmo lado, os extrativistas da
Resex Alto Juruá. Todos juntos em defesa de uma gestão sustentável e solidária
dos territórios que compõem o mosaico de áreas protegidas da região do Juruá.
Assim se configura mais um episódio da Aliança do Povos da Floresta, idealizada por Chico Mendes em meados dos anos oitenta
para unificar as principais bandeiras dos movimentos sociais da Amazônia em sua
luta pelo desenvolvimento sustentável da região.
No início do mês de maio, foi realizado, no
Centro Yorenka Ãtame, o curso para monitores ambientais da Reserva Extrativista
Alto Juruá, do qual participaram mais de quarenta representantes de trinta e
quatro comunidades. Tive a honra de, junto com o professor Mauro Almeida e a
gestora da Reserva Extrativista Riozinho da Liberdade, Júlia Vilela, ministrar
algumas palestras no evento, que integra o conjunto de ações do projeto Alto
Juruá.
Ficou evidente que naquele momento, não havia alunos, nem professores.
Todas e todos ensinávamos e aprendíamos, juntos, ao mesmo tempo. Afinal, os extrativistas
têm uma sabedoria ampla acerca do funcionamento de tudo o que vive em seu
território. Além disso, são protagonistas de sua própria história.
Conhecem bem, e a fundo, cada detalhe do processo que há por trás da
constituição de sua Reserva. Foram eles os responsáveis pelo alcance dessa
conquista. Nada foi fácil. E todas as conquistas seguem exigindo disposição
para a luta; o que eles têm de sobra.
O Projeto Alto Juruá, de autoria dos Ashaninka da Apiwtxa, é o primeiro
do Fundo Amazônia aprovado diretamente em favor de uma associação indígena no
Brasil, iniciado em abril de 2015 pelo Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social – BNDES. Com duração de três anos, atua no assessoramento,
capacitação e implantação de sistemas agroflorestais; apoio à gestão
territorial e ambiental às comunidades indígenas e tradicionais do Alto Juruá; e
desenvolvimento institucional das organizações comunitárias.
Um dos grandes diferenciais do projeto é o fato de que as ações não foram
pensadas para beneficiar apenas as populações indígenas, mas também as
comunidades da Resex Alto Juruá, vizinha à Terra Indígena.
Isso revela a manifesta sabedoria dos povos tradicionais que, não só compreendem
que a conservação e o respeito à floresta dependem da união das forças de todos
na região, mas exercem a solidariedade entre vizinhos irmanados em direitos e
deveres em relação à Mãe Terra.
As comunidades da Resex andam
preocupadas com o futuro das comunidades e do território. Dificuldades na
geração de renda por meio das atividades produtivas tradicionais, chegaram a
desanimar. Mas, valentes que são, impulsionados pelo apoio dos vizinhos
Ashaninka, os membros das comunidades da Resex reagiram. Após a parceria
estabelecida por meio do Projeto Alto Juruá, os extrativistas avançaram
rapidamente no plantio de sistemas agroflorestais (SAFs). A grande maioria das comunidades
envolvidas já iniciou seus plantios, preparando a terra, construindo viveiros e
plantando mudas. A ideia do Projeto é consolidar uma rede de proteção ambiental
dos territórios e de cooperação em atividades voltadas à geração de renda.
Essa
imagem foi a mais importante que vi por lá ao participar de um capítulo dessa
história que os Povos da Floresta estão escrevendo. Eu vi gente sábia, íntegra,
competente e batalhadora, trabalhando duro para garantir um futuro para si e
para os seus com respeito profundo ao meio ambiente. Para garantir um futuro para
a floresta, tirando dela o seu sustento. A tradicionalidade materializada nas
propostas, nas falas, nos atos. Vi todo mundo cheio de vontade de aprender e de
ensinar. Disponibilidade de estender e dar as mãos; e de construir a partir de
muitas cabeças e mãos, essa tal gestão sustentável. Vi a Aliança em movimento. De
onde estiver, Chico deve estar sorrindo também, ao constatar que a Aliança
segue bela e forte!
Por Maria Augusta B. Assirati
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