06/08/2011

Antropólogo e mateiros se unem para defender índios do tráfico

Sem poder contar com o efetivo apoio da Polícia Federal e do Exército Brasileiro, os servidores da Funai se dispõem a reforçar agora a vigilância na fronteira

por MONTEZUMA CRUZ, Agência Amazônia de Notícias, 06/08/2011

CAMPO GRANDE (MS) – O antropólogo Terri Aquino, dois mateiros e o coordenador de índios isolados no Acre, Jose Carlos Meirelles, decidiram se unir para enfrentar o narcotráfico peruano que ameaça povos indígenas na fronteira brasileira com o Peru. Levados de helicóptero para a região, a cerca de 800 quilômetros de Rio Branco, lá estão, sem data para retornar às suas bases na floresta.

Trabalhando para a Fundação do Índio (Funai) há mais de 30 anos na floresta amazônica, Aquino lamenta que integrantes desse ‘grupo paramilitar peruano’ – conforme ele designa – invadiram recentemente a base Xinane, da Frente de Proteção Etnoambiental Envira e continuam invadindo o território acreano, valendo-se do isolamento e da falta de guardas. Um único integrante do grupo foi preso, extraditado, mas já retornou à região.

“O território brasileiro é invadido por um bando de narcotraficantes internacionais; quando essas notícias não saem nos jornais, nem Deus fica sabendo”, diz Aquino em mensagem transmitida à imprensa.

Outro grave problema na região é a exploração madeireira por peruanos e chineses, que fora denunciada pela primeira vez em novembro de 2005 por Terri e seu colega sertanista José Carlos Meirelles. O fato vem se repetindo. Na ocasião eles chamaram a atenção para a ilegalidade dessa atividade em território tradicional dos indígenas “em isolamento voluntário” Mashco Piro, localizado no Parque Nacional Alto Purus e na Reserva Territorial Mascho Piro, incorporada a esse Parque desde novembro de 2004.

Sem poder contar com o efetivo apoio da Polícia Federal e do Exército Brasileiro, os servidores da Funai, conforme Aquino, se dispõem a reforçar agora a vigilância na fronteira, constituindo um grupo mais numeroso formado por indígenas Ashaninka e Kulina do alto Rio Envira, e Kaxinawá dos altos rios Humaitá e Jordão.

Aquino lamenta que grupamentos das forças de segurança nacional se limitem a operações pontuais ao longo da fronteira, retornando logo em seguida aos quartéis. No entanto, ofereceu-se para auxiliá-los: “Se precisarem de mim é só chamar para que possamos criar esse incrível exército Brancaleone e atuar nessas lindas matas das proximidades do Paralelo 10 graus Sul, essa extensa linha imaginária da fronteira internacional Brasil–Peru.”

“Se vierem, venham para resolver”

Este é o apelo de Aquino, na íntegra:

“A todos os companheiros de luta e família. Como o tempo é curto e é muita gente, me desculpem misturar familiares e trabalho. Como todos sabem a nossa base do Xinane foi invadida por um grupo paramilitar peruano, onde foi preso por uma operação da polícia federal, um único integrante.

O famoso Joaquim Fadista, que já tinha sido pego aqui por nosso pessoal, foi extraditado e voltou. Com um grupo de pessoas cuja quantidade não sabemos.
A operação foi muito rápida e hoje todo mundo foi embora. Nossa base ficou só de novo.

Já que ninguém deste Estado brasileiro se dispõe a ficar aqui, tomamos a decisão, Carlos Travassos, coordenador dos isolados, Artur coordenador da frente, Eu, e dois mateiros nossos – Marreta e Chicão – de vir pra cá. Fomos deixados pelo helicóptero da operação.

Os caras ainda estão por aqui. Correram quando o helicóptero chegou. Rasto fresco e cortado de hoje. Se o povo da PF ou Exército estivesse aqui a gente pegava todo mundo.

Parece que as coisas não são bem assim. Talvez se esse grupo tivesse invadido algum canteiro de obra o PAC, metade do exército já estaria lá. Mas como é uma basezinha da Funai, área de índios isolados.

O fato é que aqui ficaremos até que alguém ache que uma invasão do território brasileiro por um grupo paramilitar peruano é algo que mereça atenção. Somos irresponsáveis. Talvez. Mas antes de tudo existe um compromisso maior com os índios isolados e os contatados nossos vizinhos Ashaninka.

Não temos resposta pra tudo isso. Mas estamos bem perto das perguntas. Permaneceremos aqui. E nem venham nos buscar para abandonar a base de novo e nem venham aqui passar dois dias. Se vierem, venham pra resolver o problema. Caso contrário, a gente mesmo vê o que faz. Um abraço a todos.”

NOTA
Os grifos são do antropólogo Terry Aquino.

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